sábado

A juventude e a resistência rebelde

O mundo testemunhou, de forma impactante, a uma forte rebeldia se corporificar em todo o planeta. Uma indignação e revolta que está a redimensionar as lutas sociais, e que já é capaz de gerar fortes inquietações junto aos “donos do poder”.

Uma resistência organizada de maneira singular, que se contrapunha a lógica do capital e do pensamento único, que enfrenta a globalização neoliberal, não como algo dado e imutável, e sim como uma questão a ser enfrentada frontalmente. Este movimento deu os seus primeiros sinais de força no final da década de noventa, surgindo de forma quase que inesperada para muitos.

Após a uma onda avassaladora de imobilismo e de perda de referencial de amplos setores da esquerda em todo o mundo, no pós-queda do muro de Berlim, aliadas a importantes vitórias do capital sobre os trabalhadores (flexibilização dos direitos trabalhistas, desemprego em massa, etc.). Já se ouvia algumas vozes “precipitadas” alardeando que “a história havia acabado” e que o mundo chegava ao seu estágio final de organização sócio-econômica.

Acompanhada de uma expropriação cada vez maior do trabalho, agudizando-se ainda mais globalmente. Onde a estrutura econômica mundial, cada vez se centra mais em alguns “bolsões de riqueza”, que amplia a concentração do capital, elevando as disparidades entre as classes e regiões. As diferenças entre o operariado e a burguesia são ainda maiores do que foi há algumas décadas atrás.

A opressão sobre o trabalho ampliou-se como regra, onde a ideologização neoliberal apossou-se sobre grande parte dos trabalhadores, que passaram a perder de maneira sistemática alguns de seus referenciais mais importantes. Boa parte dos sindicatos perdeu muito de sua combatividade, passando a atuar muito mais na defensiva, apenas tentando evitar perdas ainda maiores de direitos para suas categorias.

A queda do muro de Berlim foi para muitos o símbolo que demarcou o fim de uma “utopia” e momento de encarar os problemas do sistema capitalista com realismo. Nos conformando de que o que está posto hoje não pode ser derrubado, apenas “transformado”. Todo uma história de lutas e de formulações teóricas haviam sido jogadas ao “limbo” e consideradas como apenas mais uma “página virada” da história.

Assim a social-democracia, por exemplo, que na Europa tinha sido nas décadas anteriores defensora do chamado “estado de bem estar” passa a abandonar uma perspectiva de busca por um “capitalismo humanizado” e passa a seguir a todo o receituário neoliberal. Se antes, a perspectiva da centro-esquerda já era limitada, se resumindo a lutar por ações como uma maior pensão para os trabalhadores aposentados, alguma redução dos índices de desemprego, etc. em uma concepção de transformação gradual de algumas das formas de desigualdade mais visíveis e insustentáveis. Atingindo-se apenas uma sustentação ilusória, onde apenas são maquiadas as desigualdades, e de nenhuma maneira contestadas a sua essência. Agora se passou a naturalizar a todos malefícios mais visíveis e apontam o mercado e o estado mínimo como as únicas vias possíveis de serem trilhadas no século XXI.

Esta hegemonia do “pensamento único” e do não enfrentamento ao capitalismo, apenas propiciou a um sem número de derrotas da classe trabalhadora, e uma ampliação e potencialização das mazelas do sistema. Os direitos trabalhistas passaram a serem suprimidos um a um, as agressões ambientais tornam-se ainda maiores e mais corriqueiras, as liberdades básicas de mulheres e homens passaram a ser ignoradas, os jovens tornaram-se ainda mais oprimidos, em uma explicitação do caráter regressivo do período atual.

As contradições se aprofundaram de tal maneira, que muitos setores, que antes se encontravam em uma apatia geral, começaram a demonstrar sinais de descontentamento.

A insatisfação das camadas oprimidas acentua-se e passou a se evidenciar. Como diria Marx, “tudo que é solido se desmancha no ar” e a ordem neoliberal começou a demonstrar sinais de seus limites. As manifestações que ocorreram em Washington em 1998, foram catalizadores de um processo que demonstrou para muitos incrédulos que havia uma possibilidade de se remobilizar a classe trabalhadora e que havia um amplo segmento juvenil disposto a arriscar a construção de uma outra lógica.

Mas, para muitos, o movimento só passou a tomar contorno após Seattle, em 1999 onde ocorreu uma manifestação grandes proporções. Contando-se com a participação de milhares de pessoas, devido a reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC), que foi um acontecimento que tomou dimensões espetaculares, e inimagináveis naquele momento. Servindo de impulsionador de uma série de manifestações de grande impacto que se sucedeu em diversas partes do mundo, dando um caráter de rebeldia internacional contra o grande capital. Praga, Milão, Nice, Buenos Aires, Quebec, Gênova, onde o capital venha a reunir é alvo de uma grande oposição internacional.

A juventude vem desempenhando um papel fundamental em todo este processo, onde ela tem sido um dos principais agentes. Isto se justifica facilmente, em razão de ela ter sido uma da mais afetadas pelas políticas neoliberais, onde ela tem o seu ensino desqualificado e transformado em mera mercadoria, a impossibilidade de ingresso ao mercado formal de emprego, o desrespeito as suas particularidades, são apenas algumas das propulsoras da rebeldia e insatisfação que importantes setores da juventude tem assumido no último período.

Todas estas lutas ainda carecem de um “corpo” político maior. Elas ainda possuem um caráter muito mais defensivo do que propriamente propositivo. A rebeldia na ação da juventude nestas manifestações, até mesmo a forma como tem se organizado são aspectos positivos que abrem possibilidade de avanço e de consolidação deste movimento, se houver um processo de maior politização que combine junto a um grau organização maior.

A inserção da juventude, em todo este processo, tende a se ampliar, atingindo determinados setores que ainda não estão hoje integrados substancialmente. Um esforço para que sejam incorporados e propiciem uma maior massificação das lutas gerará uma concretização de uma reversão do curso político estabelecido no mundo. Buscando dialogar e construir organicamente uma relação política com outros setores como o movimento estudantil, por exemplo. O que pode dar o salto qualitativo que o movimento anti-globalização necessita.

Ainda não se pode dizer com toda a clareza quais serão os rumos a serem tomados. A burguesia já se organiza a fim de neutralizar todo o movimento internacionalista de enfrentamento ao capital que se consolida. Já sistematiza formas muito mais brutais de repressão contra os manifestantes, tenta gerar fatos que venham a desagregar e desmobilizar o conjunto de forças heterogêneas que estão unidas em uma luta comum.

Cabe ao movimento gerar formas de organização que superem os seus atuais limites (que não são pequenos), buscando atingir a uma maior coesão de ação e política. E principalmente que tente agregar, de forma decisiva, uma perspectiva a luta anti-globalização que aponte claramente para uma perspectiva de ruptura com o capitalismo e de luta pela construção de um novo horizonte para a humanidade: um horizonte socialista.

Inverno de 2002

1905: lembranças do "ensaio geral"

Este ano, completa-se cem anos da revolta de 1905 na Rússia. O que nos faz rememorar um momento marcante na história, que ficou conhecido como o "ensaio geral" para a vitoriosa revolução de 1917, que instaurou o regime soviético.

A Rússia naquele período tinha um sistema político absolutista, comandado pelo Czar Nicolau II, que enfrentava um grande desgaste político devido a Guerra Russo-Japonesa, iniciada em 1904 e que tinha um caráter imperialista: a disputa do domínio da Coréia e da Manchuria. Esta guerra ampliou as contradições do sistema, extremamente hierarquizado, onde o desenvolvimento capitalista não tinha atingido de forma plena o país, as desigualdades sociais eram gritantes e a mobilidade social quase nula.

A derrota do Czar na guerra com o Japão gerou um fortalecimento do movimento de oposição. Movimento que teve sua primeira manifestação forte em janeiro de 1905, quando uma manifestação popular pacífica em frente ao Palácio de Inverno de Nicolau II, em São Petersburgo, foi reprimida violentamente, dizimando centenas. O episódio ficou conhecido como o Domingo Sangrento. A onda de protesto, a partir daí, espalhou-se por todo o país, resultando em greve geral e levantes militares, como o do famoso Encouraçado Potemkin.

Este movimento forçou um processo de democratização do regime, convertendo-se uma monarquia absolutista em uma monarquia constitucional e parlamentar. Esta "abertura" durou pouco, em 1906 o Czar já havia reduzido os poderes do parlamento e adotado sucessivas medidas que lhe restituíram os seus antigos poderes. O que lhe causou um longo e ainda maior desgaste político.

No entanto, o mais importante deste episódio é seu caráter embrionário de um movimento muito maior, que doze anos depois transformaria a Rússia na primeira experiência de um país regido por uma orientação socialista. Cabe recolhermos as lições deste passagem histórica que possibilitou a "virada" nos rumos daquela sociedade. O mundo em 2005 não é o mesmo, nem a classe operária nos países industrializados permite paralelos com o proletariado russo da época.

No entanto, talvez uma das principais lições que se mantêm extremamente atual, é a não linearidade pré-definida dos acontecimentos. Não há uma "rota" pré-determinada que não possa ter o seu percurso alterado. Esta é uma das mais valiosas lições de 1905. Pois em 1906 ou 1907, as vozes de que as massas populares tinham sido derrotadas, de que avanços reais seriam impossíveis eram muitas. A maioria não poderia imaginar que uma década depois o Tzarismo cairia e os trabalhadores assumiriam o poder.

É esta imprevisibilidade, no sentido de demonstrar que não existe "jogo já jogado" antes mesmo de iniciado, que abrem as possibilidades para novas experiências que venham a colaborar com a emancipação humana neste século XXI.

Um país sem analfabetos

Há poucas semanas atrás, um país vizinho ao nosso, a Venezuela, anunciou que foi declarada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) território livre de analfabetismo. Um feito de grandes proporções que merece uma atenção maior de todos nós.

A Venezuela era um país que, assim como o Brasil e os demais países da América do Sul, enfrentava um quadro extremamente perverso em relação a educação. Antes de Hugo Chavez e a “Revolução Bolivariana”, o governo venezuelano havia alfabetizado, em uma década, pouco mais de 70 mil pessoas. Em um ano e meio do atual governo, foram mais de 1,4 milhão de pessoas através da “Missão Robinson”. Este programa que erradicou o analfabetismo, teve seu inicio em meados de 2003. E não se restringiu apenas a população urbana, mas a todo o conjunto da população, como por exemplo, mais de 70 mil indígenas receberam educação bilingüe.

Isso não ocorre por acaso. Há uma prioridade política do governo venezuelano de inverter prioridades e trilhar um caminho de desenvolvimento economico-social autônomo, fugindo das amarras do neoliberalismo. Prova disso é o investimento em educação, que antes de Chavez era de 2,7% do PIB, passou para 7%. E isto, apenas um país autônomo e livre pode orientar o seu orçamento para o social. Parte-se do pressuposto que isto não é um gasto, mas sim um investimento. A conquista venezuelana representa para todo o conjunto da América Latina a possibilidade real de se mudar e avançar nas conquistas sociais.

Este é um exemplo que para a realidade brasileira deveria ser buscado. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 13,3% dos brasileiros com idade superior a 15 anos são analfabetos. A pesquisa especifica ainda que, 37,5% dos jovens e adultos brasileiros conseguem ler apenas títulos ou frases curtas, tendo um analfabetismo funcional. Números que por si já demonstram a urgência de encarar-se de frente este problema. O exemplo venezuelano mostra que isto só é possível com vontade política. O que falta em alguns governos.

Trabalho: há avanços?

Quando se debate sobre as condições atuais das relações de trabalho e como elas se relacionam, via de regra, se houve afirmações no sentido de que evoluiu para um novo e dinâmico estágio, onde as desigualdades gradualmente se superarão.

Ao se contestar este tipo de afirmação, de imediato se é tachado de “obtuso”, “jurássico” etc. No entanto, estes analistas que ocupam grande espaço nos meios acadêmicos e na grande mídia, observam apenas alguns fatores da evolução do mundo do trabalho, não o todo. De fato, houve avanços significativos no campo do desenvolvimento tecnológico dos meios de produção, a internet venho para encurtar barreiras e novas frentes de trabalho surgiram nos últimos 30 ou 20 anos.

No entanto, esta “modernização” venho acompanhada por uma onda global de desemprego, que em alguns países chega a tomar contornos estruturais. Como decorrência, a flexibilzação das relações de trabalho se ampliaram absurdamente, aumentando o grau de exploração e alienação do trabalho nas atividades profissionais. Esta alienação se demonstra pela “coisificação” do homem em sua relação social. Onde se expressa uma clara “distorção do universo histórico-social do homem em um universo do dinheiro e da mercadoria estranho e hostil ao homem, no qual a maioria da humanidade existe apenas com trabalhador 'abstrato' (isolado da realidade da existência humana), apartado do objeto de seu trabalho, forçado a vender a si mesmo como mercadoria.”(Herbert Marcuse).

E esta é uma realidade indissociável do “Modus operandi” do sistema capitalista. A pseudo-modernização das relações de trabalho advindas da globalização, não se confirmam na vida. Ficando apenas no campo das ilusões de quem as vende e/ou acredita nas mesmas. Pois, além de não ter se “modernizado” favoravelmente ao trabalhador, ainda tenta-se retroceder ao operar-se uma agressiva flexibilização global das relações de trabalhistas.

Um verdadeiro avanço se dará sob outros marcos. Isto poderá se concretizar, superando o caráter alienado do trabalho humano, onde mulheres e homens convertam-se em donos de seus destinos, dos meios de produção e de seu consumo. No qual todos tenham garantido o direito ao trabalho. E mais do que isso, o próprio direito a existência digna, visto que isto é muitas vezes brutalmente negado. Com os conhecimentos e as forças produtivas atuais, poderia-se permitir a satisfação das necessidades materiais e culturais essências da sociedade. É este o horizonte que devemos lutar para tornar realidade.

Um país para poucos

O Brasil é um país de imensas potencialidades. No território brasileiro temos a maior quantidade e diversidade de minérios que se tem conhecimento, temos reservas de petróleo que podem nos dar auto-sustentabilidade energética, a maior proporção do mundo de água doce e a maior biodiversidade. Ainda assim, é um país pobre, onde a maioria da população é carente de condições dignas de vida.

Este quadro contraditório não ocorre devido à nenhum mistério. Tem razões e motivos claros. Que se verifica desde a sua formação. O Brasil foi colônia portuguesa de 1500 à 1822. Foram mais de três séculos de roubo das riquezas naturais, extorsão por meio de tributos, escravidão e genocídio. Depois do domínio de Portugal, o Brasil continuou submetido a Inglaterra, depois aos EUA e, atualmente, às empresas e bancos transnacionais.

Levando a observar um quadro de formação nacional que tem como marca principal a injustiça e as desigualdades sociais. Explicando, em parte, a manutenção da imensa maioria empobrecida, devido diretamente a concentração de riquezas na mão de poucos. Pesquisa do IPEA, demonstra que em 2002, o 1% mais rico da população possui a mesma fatia da renda nacional ganha pelos 50% mais pobres.

Os motivos que geram esta concentração são diversos. Mas destacaríamos a falta de democracia econômica, a política fiscal dos governos, que prioriza o gasto com pagamentos dos juros das dívidas interna e externa aos banqueiros e com isto corta gastos com infra-estrutura e serviços públicos. Outro fator é a política tributária, que beneficia os que tem muito e taxa principalmente os consumidores. Além da falta de mecanismos de controle sobre a entrada e saída de capital do país.

O Brasil possui a quarta maior concentração de renda do mundo. Que desemboca em um cenário de alargamento do fosso que separam a minoria abastada da grande maioria do povo. Este quadro não é irreversível, pode e deve ser superado ou suprimido. E só é possível quando a população se mobilizar para pressionar por mudanças que democratizem a renda e riqueza. Onde o Brasil que é rico de recursos passe também a ser rico em igualdade e justiça social. Deixando de ser um país para poucos.

UERGS: democracia ferida

Os problemas que passam a UERGS, fruto de visões equivocadas de ensino e do descaso do Governo Rigotto, infelizmente não chega a ser uma novidade. Para certificar-se deste quase abandono, basta olhar os cortes nos investimentos feitos na universidade nos últimos anos, por exemplo.

A novidade é que ao final de 2004, o Reitor da UERGS publicou a Resolução n° 08/2004, que passou praticamente desapercebida pela maioria da sociedade. Nesta resolução foi instituído o Código e a Comissão de Ética da UERGS. Nesta, fica claro o objetivo de inibir a livre atividade e manifestação pública no interior da universidade nos três segmentos da instituição (professores, corpo de funcionários e estudantes).

A resolução, reiteradas vezes expressa limites e barreiras para a manifestação e a organização dos segmentos da universidade, e isto por diversas vezes se coloca de maneira dúbia. E esta dubiedade do que seria "adequado" e "ordeiro" (conforme as expressões utilizadas na resolução) se torna mais preocupante ao se observar quem julgará isso: uma Comissão de Ética formada por cinco pessoas, todas nomeadas pelo Reitor. Sem haver nenhuma abertura democrática no processo de escolha dos integrantes desta comissão. E esta Comissão, extremamente parcial, terá poderes para definir sanções que, conforme expresso no art.6° da resolução, podem ser de "(...) repreensão, suspensão ou afastamento definitivo". Ou seja, abre-se a possibilidade de haver perseguições políticas.

Indo completamente na contramão da história. O Brasil vive neste ano a passagem dos 20 anos do primeiro governo civil depois da ditadura militar de 64, e de um processo lento de consolidação de sua democracia. Onde o Rio Grande do Sul é exemplo para o mundo, ao implementar práticas que aprofundaram a democracia, como o Orçamento Participativo. Causa estranheza uma medida destas, tomada pelo Reitor Boeira. A única explicação possível é a intolerância ao contraditório, a divergência de idéias.

Ações como esta frutos de uma visão tacanha de sociedade, não compreende o papel formador para o estudante que tem a sua participação no movimento estudantil. Propiciando uma maior integração com o todo, aprimorando o senso crítico e desenvolvendo a própria cidadania do indivíduo.

Não se constrói uma verdadeira universidade sem o direito há ampla democracia interna. Sem a garantia de liberdade de organização e manifestação. Triste momento para a nossa universidade pública.

Onde está a participação?

A melhor forma de a administração pública ter uma verdadeira política de inserção da população e uma maior transparência nas suas ações é através da participação popular. Mas esta participação, para ser verdadeiramente inclusiva e afirmativa em relação ao papel do povo, enquanto agente consciente e elaborador das soluções para as suas necessidades, deve ser pela participação direta.

Está mais do que evidente que processos promovidos pela administração pública que visam, pelo menos em discurso, a participação da população nas decisões não passam de "faz-de-conta" se não garantirem o direito a participação e a decisão do conjunto de moradores, de todas as comunidades da cidade. Este processo não pode, por exemplo, como vem acontecendo em Canoas ser delegado a entidades ou associações, pois se estará tirando do povo a possibilidade de se inteirar, opinar e até mesmo entender o funcionamento de uma prefeitura. Muitas vezes, estas entidades que deveriam representar os moradores de um determinado bairro não têm verdadeira legitimidade junto a população, visto que muitas das entidades não tem a participação dos moradores e sim de um pequeno grupo que só representa à si mesmo.

Não quero aqui desconsiderar o papel fundamental que muitas associações de moradores tem em suas comunidades, e sim defender a necessidade de termos a visão da participação de todos como melhor que a de apenas alguns. Outro problema no método que vem sendo posto em prática pela prefeitura de Canoas é que, ao não incentivar a participação direta da população da cidade nas decisões e na fiscalização, ele acaba por fechar-se em si mesmo, pois deixa de ter um acompanhamento direto da população sobre as contas do município, bem como das realizações e implementação de obras na cidade, sendo que as mesmas não foram apontadas pelo conjunto de moradores dos bairros e vilas da cidade, e sim por terceiros.

Estes são apenas alguns dos problemas, poderíamos aprofundar muito mais. Tendo estes problemas no método atualmente empregado pela prefeitura, aponta-se atualmente como o melhor mecanismo de inclusão e participação popular, o Orçamento Participativo, nos moldes como vem sendo empregado na Prefeitura de Porto Alegre e em muitas outras prefeituras do país. Através do OP a população tem a possibilidade da participação, fiscalização e decisão direta, sem intermédio de ninguém.

Não a redução, sim a inclusão

Todos nós acompanhamos através da imprensa as recentes, e polêmicas, declarações do cardeal-arcebispo de Aparecida (SP) Dom Aloísio Lorscheider defendendo a redução da maioridade penal, dos atuais 18 para 16 anos.

As declarações vêm empolgadas pelo calor da perplexidade de um assassinato de dois adolescentes em Embu-Guaçu (SP), onde um menor teve participação no crime. Hoje, principalmente após a ocorrência de fatos como estes tal proposta acaba tendo forte e fácil acolhida em setores que, frente ao caos social e ao aumento da violência, buscam por soluções rápidas e fáceis para resolver este problema, que é o da violência, e a sua ocorrência entre menores de idade.

Socialmente, tal proposta acaba por ser ineficaz, sem efeitos reais de mudança para a sociedade. Um jovem menor de idade, ao cometer uma infração, deve passar por um esforço por parte do Estado e da sociedade na sua reabilitação e inclusão na sociedade. A redução iria piorar a situação, ao expor pessoas ainda em processo de formação ao convívio terrível e deteriorado do sistema prisional brasileiro. Ao invés de buscarmos políticas inclusivas para os jovens em situação de risco, ao implementar uma redução da maioridade penal, estaríamos os jogando a uma situação de maior exclusão. Simbolizando um gesto do Estado e da sociedade no sentido de agravamento do quadro colocado, não o inverso, que seria o esperado em uma situação destas.

Ao se pensar nos mecanismos para enfrentar o problema da criminalidade entre os menores, a sociedade só irá de fato atingir a raiz do problema, se partir de uma lógica inclusiva e emancipadora. Fugindo do erro, muitas vezes cometido no Brasil, de se implementar soluções meramente imediatistas, principalmente de caráter punitivo e midiático. Toda esta problemática deve ser encarada fundamentalmente sob o prisma do problema social que o gera, não pelo inverso. Uma medida simples, que com certeza traria importantes avanços para a vida real das pessoas seria o cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com algum aperfeiçoamento possível, só aí já teríamos mudanças qualitativas que poderiam de fato mudar o atual e triste cenário onde nos encontramos atualmente no Brasil.

O esforço deve ser no sentido de se promover uma real inclusão social, através de medidas que atendam a problemas imediatos. Mas que também se pensem em médio prazo, políticas que venham a solucionar de fato o problema da violência e exclusão social, não através de propostas absurdas como esta da redução da maioridade penal.

Juventude e a participação política

Há um bom tempo, se tem escutado afirmações que vão no sentido de que os jovens de hoje são apáticos, não querem se envolver com nada e são, na sua maioria, desinteressados pela política. Contudo, uma recente pesquisa vem "botar por terra" esta tese.

Em pesquisa realizada pelo IBOPE, encomendada pelo Observatório da Educação e da Juventude, divulgada no final de novembro de 2003, sobre a participação política, aponta dados sobre o esboço do perfil político do brasileiro. A pesquisa mostra um dado que pode surpreender: os jovens são os mais interessados em participar dos mecanismos e instâncias capazes de influenciar a política. Do total de entrevistados, foi no segmento mais jovem, entre 16 a 24 anos, que tiveram os maiores índices, 54%, de interesse e disposição de participar. Mesmo dentre os que afirmam não querer participar, os jovens são os que mais acreditam que a sua participação não faria diferença. Demonstrando que este segmento sente ter pouco poder, o que inibe a sua participação efetiva. Mas apesar disso, há disposição de participar, e é nisto que devemos investir ao pensar políticas que promovam uma maior participação popular.

Esta pesquisa da conta de que 56% da população geral entrevistada não deseja participar de nenhuma ação capaz de influenciar as políticas públicas no Brasil. O principal motivo deste desinteresse, apontado por 35% dos próprios entrevistados, é a falta de informação. De certa forma não chega a surpreender, visto a dificuldade e o monopólio do acesso a informação em nosso país. Este dado demonstra que a falta de maior participação não se dá por não haver disposição ou mesmo desinteresse dos vários setores da população, mas sim por não haver mecanismos que estimulem e promovam o acesso à informação e a inclusão das pessoas na política do país. Iniciativas como o Orçamento Participativo, conselhos setoriais e organizações populares vão neste sentido, de promover a cidadania e a inclusão política.

O resultado desta pesquisa é perceber a necessidade de haver uma alteração da organização política, e então modificarmos a estrutura de poder político e incluir nas suas decisões e execuções os agentes diretamente atingidos por ela. A juventude tem a possibilidade de ser um dos principais setores da sociedade a promover este reordenamento político, tanto pela sua disposição em realizar isto como pela sua expressão social.

A juventude deve desde já construir a sua intervenção social unificada, de modo que exerça maior influência de decisão sobre a política geral, seja nos movimentos ou na institucionalidade. O que pode gerar maiores e importantes conquistas sociais para todo o conjunto.

A luta nas universidades pagas

Uma realidade inegável na educação brasileira atual é a voraz expansão das universidades pagas. Mais de 80% dos estudantes no Brasil são obrigados a estudar nelas devido, principalmente, ao ataque sofrido pelas universidades públicas durante o neoliberalismo, onde se passou a inverter as prioridades do Estado em investimento público para a educação e passou a se incentivar a proliferação de instituições privadas em todo o país, remetendo ao capital privado a responsabilidade do Estado em proporcionar ensino público, gratuito e de qualidade para todos.

Em um quadro destes, se torna indispensável a luta por uma radical inversão destes números, construindo-se um projeto de ensino público, universal e de qualidade. Tendo este horizonte estratégico, é indispensável que se tenha uma forte construção de alternativas que passam necessariamente pelo movimento estudantil. A construção do movimento estudantil, nas universidades particulares passa por uma completa interação com as realidades e demandas inerentes a vida dos estudantes, onde se busque um outro patamar organizativo da pauta do próprio movimento, construindo uma nova cultura política no movimento.

Um dos erros que comumente se comete nas instituições privadas, é o de se subestimar a real capacidade de mobilização dos estudantes. Um fator determinante para isto, é de se levar em conta que a maioria dos alunos matriculados nas privadas, são pessoas trabalhadoras, que lutam para custear os seus estudos. Que, devido ao desmonte do ensino público no país, não obtiveram possibilidade de ingresso nas universidades públicas.

O que denota, a necessidade de se pautar junto ao movimento, a defesa intransigente de uma universalização e concretização de uma universidade que prime pelo ensino público, gratuito e de qualidade. Mas, na atual realidade do ensino brasileiro, a algumas lutas pontuais que exigem um grande esforço de mobilização por nossa parte.

1-A mercantilização do ensino

A forma como o ensino é conduzido por boa parte das instituições privadas, tem toda a sua lógica voltada para a “preparação” para o mercado de trabalho. Onde se deixa à qualidade de lado, e se pensa apenas sob o prisma do lucro.

Muitas destas instituições já se assumiram em uma condição de meros confeccionadores de diplomas. Não a o menor critério educacional para o ingresso nos cursos oferecidos, bastando ter disposição para pagar as altas quantias cobradas. Passando-se inclusive ao cumulo de se formar em dois ou três anos no máximo, assistindo-se apenas uma ou duas aulas por semana. Perdendo-se todo e qualquer vinculo comunitário e de cidadania. Deixando de lado a primazia da função social que o ensino universitário deve necessariamente ter, bem como com a própria qualidade mínima que as universidades deveriam apresentar em seu atual “status” formador na sociedade brasileira. A principal intenção, e em alguns casos, talvez a única, é de apenas de se confeccionar diplomas.

A intenção colocada na concepção de universidade privada colocada em muitas reitorias, é de aprofundamento de uma visão empresarial da universidade. Tendo-se, muitas vezes, preocupações unicamente com a lucratividade das instituições e sua eficiência na geração dos mesmos, seja de forma direta ou indireta, tendo o comparativo entre recursos e resultados como a lógica máxima norteadora.

Comprova-se assim, toda uma disposição em se desconstituir o papel transformador que a prática educacional possibilita ao ser humano. Não se discuti, e nem ao menos se possibilita espaços com tal fim, as questões pertinentes à sociedade. É nosso papel, o de fomentar a discussão, de ser potencializadores do senso crítico dentro da universidade. Somente desta forma se possibilita uma disposição dos estudantes em não aceitarem a mercantilização da educação.

2- O combate às mensalidades

Dentro da mercantilização do ensino, a mensalidade entra como peça chave para a efetivação desta proposta. O próprio fato da existência das mensalidades entra em contra-senso com uma visão universalizante da educação.

Em um horizonte estratégico, é evidente que a extinção de toda e qualquer cobrança de mensalidades e de taxas sobre os estudantes seria o caminho para uma real mudança no padrão de ensino. Mas tendo a atual realidade dada, é necessário que se gerem políticas que combatam a ganância dos “tubarões” do ensino. Ações que inibam, e principalmente, anulem os aumentos nas mensalidades são fundamentais. Tendo evidentemente a compreensão da conjuntura e da especificidade de cada universidade nesta luta. A atual legislação em vigor vem permitindo às universidades praticarem os atuais aumentos desenfreados nos valores cobrados dos estudantes, elevando de forma astronômica os lucros dos donos das universidades.

É mais que urgente que se busque a revogação da Lei 9.870/99, nos moldes como ela esta posta. Que se gestione mecanismos de controle por parte da comunidade acadêmica dos gastos das universidades, tendo-se total abertura das planilhas de investimentos e se construa mecanismos de regulamentação dos valores cobrados nas mensalidades.

3 - Pelo fim do FIES. Pela implementação de bolsas de gratuidade

Pode-se afirmar que a defesa de um ensino superior público, gratuito e de qualidade, universal para todos os estudantes, seja um horizonte estratégico do conjunto dos estudantes no país. No entanto, não podemos negar a realidade posta hoje no país. Por isso é mais que necessário que façamos mudanças e alterações nas prioridades e práticas hoje postas no ensino privado no país, tendo por objetivo uma radical derrota da lógica mercantilista no ensino.

Estima-se que as universidades pagas no Brasil movimentam por ano um valor superior a R$ 10 bilhões, ficando um percentual significativo deste valor como lucro para as universidades pagas, não sendo considerada a função social do mesmo. Nisto se incluí as universidades "filantrópicas", "confessionais" e "comunitárias", que em diversos casos não aplicam as funções que deveriam cumprir.

O governo FHC, buscando "ampliar" o acesso ao ensino, instituiu o FIES, que acabou se configurando num instrumento de "agiotagem" contra os estudantes, visto as exigências que são feitas e as formas de pagamento do financiamento que são impostas. O FIES acaba tendo como principal preocupação não a dificuldade do estudante em pagar as mensalidades, mas a capacidade de pagar o "empréstimo" feito pelo Governo.

Como alternativa propomos que sejam concedidas bolsas em caráter de gratuidade, sendo as regras de seleção e de distribuição estabelecidas por comissões paritárias com a participação dos estudantes, sendo as mesmas subsidiadas sobre o lucro das universidades, não mais sobre verbas públicas, pois entendemos que o dinheiro público deve ser empregado nas universidades públicas. Está mais do que na hora de forçarmos as próprias universidades a terem os seus fins sociais postos em prática, resgatando o caráter do ensino como responsabilidade do Estado. As universidades privadas não são nada mais que uma concessão pública.

4 – Um novo horizonte que se abre

Após a vitória de Lula, se apresentou para o movimento estudantil e o conjunto dos movimentos sociais um novo período histórico no Brasil, onde importantes conquistas podem tornar-se realidade.

É momento de sairmos da resistência e passarmos a um movimento propositivo que garanta conquistas para todos os estudantes. É momento de se garantir a participação direta de todos os estudantes nas decisões e ações no movimento e da universidade. O momento é do ME nas universidades pagas se consolidar em todo o país como uma força viva, que venha a responder aos anseios e as necessidades reais que a realidade exige.

Que o movimento se apresente como uma alternativa real de inclusão e participação em todos corredores e salas de aulas, reacendendo a esperança e construindo um outro modelo de ensino e de ME no Brasil.

A farsa do PROCENS

Desde o começo do ano, o Deputado Estadual Sanchotene Felice (PSDB), vem buscando articular a aprovação de seu principal, provavelmente seu único, projeto voltado para o ensino universitário, o Programa Comunitário de Ensino Superior – PROCENS.

O projeto apresenta uma série de problemas, que tangem a sua própria concepção e ao método como ele vem sendo elaborado e apresentado. O PROCENS em sua elaboração, se equivoca ao buscar estabelecer uma “parceria” com a iniciativa privada no financiamento do crédito. Esta “parceria”, não é colocada de forma a buscar garantias que coíbam de forma eficaz, possíveis apadrinhamentos por parte das empresas, beneficiando com o PROCENS quem a elas convir. Bem como esta vinculação do programa a participação das empresas, opera uma transferência de recursos públicos, na forma de receita presumida, para as universidades pagas, através de isenções fiscais para as empresas que aderirem.

Estas empresas entrariam com 50% dos valores das mensalidades dos estudantes, sendo este valor ressarcido pelo Estado em cerca de 90% do valor transferido da empresa às universidades. O projeto também prevê a transferência dos 0,5% da receita do Estado destinado, constitucionalmente, para o ensino universitário para a criação de um sistema estadual de financiamento estudantil, integrando o novo PROCENS ao já existente PROCRED, que seriam os programas atendidos por estes recursos públicos. O problema é que, estes recursos deveriam, mesmo não estando constando de forma clara na atual legislação estadual, ser necessariamente alocado na UERGS. Partindo-se do principio de que o dinheiro público deve ser aplicado no ensino público, e não para financiar os “tubarões” do ensino.

O projeto prevê que do montante do valor da mensalidade, além dos 50% que ficam a encargo das empresas, a universidade deveria arcar com 30% e o estudante com os 20% restantes. Sendo que, em um prazo máximo de 24 meses o estudante deverá reembolsar aos cofres públicos o valor referente aos 50% da empresa, reajustado pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Ocorre que o PROCENS prevê que o Estado fará “caixa extra” com o dinheiro dos estudantes, visto que este valor a ser pago pelo estudante, os 50% da empresa, o Estado ressarci as mesmas na forma de isenções na ordem de 90% do valor investido. Sendo que o estudante irá pagar o valor integral, não o gasto despendido pelo Estado, gerando uma receita extra 10% arrecada do bolso dos estudantes.

O PROCENS, como o próprio nome já designa, é elaborado para ser um programa de financiamento para os estudantes das universidades comunitárias. Mas com as atuais brechas legais, não existe uma real comprovação ou regulação das instituições sobre o caráter comunitário/filantrópico. Propiciando que praticamente a totalidade das universidades do estado estariam credenciadas a participar do programa. O que é realmente problemático é que, o projeto tal como ele está, permite que as instituições com o título de filantrópicas possam destinar os 30% que formalmente o projeto prevê que elas devam arcar, seja desviado dos recursos destinados à filantropia, garantindo a isenção fiscal que a lei garante, tornando-se na prática um gasto não realizado pelas universidades, e sim recuperado.

O projeto não foi debatido na Comissão de Educação e nem na Subcomissão de Ensino Superior da Assembléia Legislativa, não foi debatido nas universidades, não recolheu de forma democrática e participativa opiniões dos estudantes (que em tese seriam os maiores interessados neste projeto). O PROCENS está sendo encaminhado de cima para baixo, visto que o Governador Rigotto encampou o projeto e está o apresentando, de forma autoritária, como projeto de Lei Complementar do executivo.

O movimento estudantil deve reivindicar que se altere o projeto em todo o seu cerne, pois se tem alguém que deve “pagar a conta”, é as universidades sobre o seu lucro, não o estudante e muito menos o cofre público. O PROCENS, como ele está, deve ser rechaçado.

Reforma Universitária: um debate necessário

Com a vitória de Lula a Presidência da República e a mudança na forma de conduzir a política do governo, abrindo diálogo com as entidades e os diferentes movimentos, muitas expectativas foram geradas, algumas um tanto quanto excessivas.

Esta mudança de postura, por óbvio, atingiu o Ministério da Educação (MEC), o que possibilitou uma abertura de diálogo do movimento estudantil junto ao Ministério, em uma lógica radicalmente oposta a adotada por Paulo Renato a frente do MEC. A UNE, principalmente sua direção majoritária (UJS/PCdoB), mas também setores da oposição na UNE (Articulação por exemplo) passaram a adotar uma postura adesista aos encaminhamentos e intenções públicas do MEC. Inicialmente, este adesismo acrítico era justificável por algumas conquistas que começaram a se esboçar. Aliando a uma aparente “boa intenção” de atender as reivindicações históricas do movimento, esta abertura chegou mesmo a vislumbrar a materialização de importantes avanços, como foi a discussão (que envolveu diversos setores do movimento, da universidade, do próprio MEC etc.) de substituição do Provão e a implementação de um novo sistema de avaliação universitária, o SINAES. Este continha na essência, uma série de melhorias que iam de encontro a pauta de discussões do movimento, como por exemplo, o fim do ranqueamento entre as universidades.

As condições do debate da Reforma Universitária

Em meio ao debate do novo modelo de avaliação do ensino superior, que ocorreu no primeiro semestre e início do segundo semestre de 2003, veio a tona o debate da Reforma Universitária. Antes mesmos das discussões avançarem, de imediato a UNE já aderiu a defesa do projeto de Reforma Universitária, sem haver garantias prévias do que iria resultar o debate da reforma. Dando encaminhamento a este projeto, o governo formou um Grupo de Trabalho Interministerial (formado pelos Ministérios da Educação, Planejamento, Ciência e Tecnologia, Fazenda e Casa Civil) para elaborar um projeto de reestruturação das IFES, e que, em tese, seria posteriormente discutido com as entidades.

Ocorre que, este final do primeiro ano do Governo Lula aponta para uma ainda maior necessidade (que nós do campo Kizomba havíamos colocando) de fortalecimento e independência dos movimentos sociais face ao governo, isto se comprova com a recente apresentação feita pelo Ministro Cristóvão Buarque na Comissão de Educação do Senado: o novo projeto de avaliação institucional para substituir o Provão de FHC, de nome SINAPES. Este projeto abandona toda a série de avanços da proposta elaborada anteriormente (SINAES) e mantém alguns dos principais vícios de concepção do Provão, como o ranqueamento e uma “pseudotecnicidade” aos moldes do Banco Mundial.

Essa “abrupta” mudança de rota na linha adotada no projeto de avaliação desnuda a idéia de total crença no espírito de mudanças progressistas e transformadoras por parte do MEC. Frente a isso, o que se pode esperar de um projeto de cunho muito mais global e estratégico, como pode vir a ser a Reforma Universitária? Quais serão as garantias do movimento frente ao MEC?

Uma reforma que não perceba no problema da escassez de recursos das universidades públicas e no papel irrenunciável do Estado na constituição do sistema nacional de educação superior no Brasil, comprometido com a qualidade e a democratização de acesso ao mesmo, não será uma reforma que atenda as necessidades mínimas do ensino superior brasileiro. Sem haver isso como princípio norteador, ficará difícil um avanço qualitativo em qualquer debate de reforma. Não podemos recuar em nenhum milímetro de nossas bandeiras históricas, pois a reforma da universidade não pode se dar em um nível que não eleve a universidade ao seu papel estratégico junto à sociedade. Deve se dar sob o marco histórico da transformação social, tendo o princípio da integração da universidade aos problemas da sociedade e trazê-la junto aos movimentos sociais, derrubando os muros de “superioridade” que separam a academia dos reais problemas do Brasil, somando-a na construção de alternativas para a sociedade.

O papel da UNE e do Movimento Estudantil

Não é razoável que a UNE tenha a defesa, de forma abstrata, da Reforma Universitária como sua posição pública, pois isso poderá causar um grande revés para o movimento como um todo. Há o grande risco desta reforma, caso venha a ocorrer de fato, se desviar das propostas históricas do movimento, indo para um patamar recuado ou mesmo de retrocesso e de adaptação ao projeto de universidade do Banco Mundial, aprofundando o caráter mercantilista iniciado por FHC.

Não é um projeto ou pauta que já está definido, há ainda uma grande margem de disputa a ser travada pelo conjunto do movimento, e esta disputa deve ser feita por nós. A proposta apresentada pela UNE de realizar em 2004 um seminário para debater a Reforma Universitária; apesar de todos os vícios que contém ou possa vir a conter no método; ainda assim pode permitir para nós travar uma importante e necessária disputa de fundo da universidade como um todo. Permitindo a nós realizar um aprofundamento do debate sobre o que seria uma verdadeira Reforma da Universidade brasileira, de quê maneira isso se efetivaria, quais as causas dos atuais problemas e insuficiências diagnosticáveis de forma geral e específica a cada universidade, enfim desembocar em uma verdadeira disputa de concepção de universidade. Descolando a UNE de sua atual postura recuada para uma posição mais avançada e elaborada.

Onde isso nos possibilitaria resgatar publicamente uma série de acúmulos programáticos de nossas concepções históricas. Rememorando experiências como as do “Alfabetação” e tantas outras iniciativas valiosas, que nós da Kizomba temos acumulado ao longo de nossa história. Fazendo esta discussão de forma a apresentar para todo o conjunto da base do movimento, inclusive fazendo necessário que nos estados (onde isto for possível) este debate se realize, possibilitando que travemos um diálogo com os mais diversos setores do movimento, inclusive de outras culturas políticas. Isso geraria um enriquecimento das discussões e um verdadeiro confronto real de posições políticas de fundo. Não devemos, como jamais o fizemos, temer o debate e a disputa programática, muito pelo contrário, deve partir de nós da Kizomba a disposição de potencializar este processo. Esta é a necessidade de efetivar este espaço nos estados; junto com a UNE, UEEs, Federações e Executivas de Cursos, DCEs, Das e CAs.

Este é uma questão que nós da Kizomba devemos desde já colocar como nossa pauta imediata de acúmulo e mobilização para o próximo período. Onde através da nossa ação, todo o conjunto do movimento estudantil explicite para a sociedade a atualidade e a necessidade de termos uma universidade pública, universal, democrática, de qualidade e gratuita. Apontando para a nossa disposição de se somar a este debate, buscando garantir um maior equilíbrio e qualidade nas discussões sobre o tema da Reforma Universitária. Do contrário corremos o risco de vermos o movimento estudantil, de forma generalizada, aderindo as “cegas” a um abismo que pode ser decisivo e fatal para os rumos da universidade brasileira.


Texto lançado em dezembro de 2003

Ousar e ultrapassar limites

No final de mais um ano de muitas lutas, onde obtivemos uma série de resultados positivos e alguns negativos, é importante que iniciemos o balanço geral de nossas ações, sob os mais diferentes aspectos. Pretendo com este texto colaborar no sentido de apresentar, de maneira breve, alguns apontamentos políticos e organizativos para a Kizomba no próximo período.

A situação colocada

Findada as eleições municipais de 2004, a esquerda socialista brasileira enfrentou talvez o pior cenário político dos últimos anos. Principalmente sob o ponto de vista da disputa de projeto e consciência. É hora dos movimentos sociais, de um modo geral, reorganizarem-se para o próximo período.

Procurando não entrar de maneira aprofundada no debate quanto aos rumos que a esquerda deverá tomar frente aos resultados das eleições, o Governo Lula e a situação como se projeta o Partido dos Trabalhadores quanto ao papel estratégico que ele pode ainda representar. Mas de antemão, reafirmando a compreensão de que a superação das contradições da sociedade, regida pelo “Deus Mercado” só podem ser superadas se houver a consciência de que a reconstrução da sociedade para um sistema que torne o ser humano guia de seus próprios destinos, que promova uma libertação por inteiro, eliminando a atual sociedade de classes, passa por termos na “fusão crescente de duas forças essenciais: por um lado, o movimento de massas cada vez mais amplas que libertam imensas energias e um capital incalculável de iniciativas populares e individuais, e por outro, um partido revolucionário, (...) podendo organizar e conduzir essas massas para um movimento que desembarque na vitória da revolução.” (E.Mandel).

Isto posto, é hora de avaliarmos de que forma poderemos estar avançando na luta social e modificando favoravelmente a dura conjuntura política do país. O Movimento Estudantil pela sua heterogeneidade e pela sua potencialidade renovadora tem um importante papel estratégico nesta disputa política. É fundamental que o nosso campo político no ME, Kizomba, assuma um papel ainda mais protagonista, que possa dar conta do conjunto de desafios que estão dados.

Reforma Universitária

A principal luta imediata a ser travada, sem espaço algum para dúvida, é a Reforma Universitária. Ao longo de todo o debate que se travou desde o anúncio pelo Governo Lula de que iria realizar uma reforma da universidade brasileira, ainda com o Cristóvão Buarque a frente do MEC, foi sempre bastante problemático. A disposição de realizar um amplo e democrático debate com a sociedade, desde o inicio, não ocorreu.

Nós da Kizomba, ao contrário de outras forças políticas, sempre nos posicionamos de maneira clara, defendemos uma postura autônoma dos movimentos sociais perante o Governo Lula. Sempre destacamos que uma reforma da universidade era importante, face todo o desmonte da gestão neoliberal. Mas que no entanto, ela deveria vir de encontro a totalidade das reivindicações históricas que o movimento da área de educação tem acumulado ao longo dos anos. Para poder interromper o ciclo neoliberal e construir uma universidade sintonizada com as necessidades do Brasil, fortalecendo o papel fundamental que deve ter a universidade no desenvolvimento nacional e na soberania brasileira, através da produção de conhecimentos e práticas direcionadas a transformação social.

O MEC, no entanto, desde a gestão de Cristóvão, mas principalmente com o Tarso Genro no comando do Ministério, optou por fazer políticas que não vão de encontro com as mudanças necessárias. Pelo contrário, tem adotado políticas que aprofundam o espectro neoliberal na universidade brasileira. Até agora, o MEC não apresentou de fato um projeto abrangente de Reforma Universitária, mas várias propostas fragmentadas que estão sendo impostas via medidas provisórias e projetos de lei, mexendo diretamente nas estruturas da educação superior e sem dialogar efetivamente com a sociedade. São muitos os fatos que demonstram isto, apenas para exemplificar, a continuidade da política de FHC de ampliação do setor privado na rede de ensino superior, o PROUNI que institui a compra de vagas nas universidades privadas em troca da ampliação do volume de isenções fiscais, a manutenção dos vetos de FHC no Plano Nacional de Educação e etc.

Na prática, temos presenciado uma adaptação do ajuste neoliberal na universidade, que anteriormente era conduzido por Paulo Renato no MEC durante o Governo FHC, e que na atual gestão do MEC tem tido a sua continuidade e incremento.

O papel e a situação do movimento estudantil

Neste cenário, o desafio do movimento será o de barrar esta política neoliberal e garantir uma verdadeira reforma do ensino superior, que vá de encontro as bandeiras historicamente defendidas.

No entanto, está não é uma tarefa simples. O movimento estudantil, de uma maneira geral, não passa por um bom momento. O grau de desarticulação e de afastamento entre as mais diferentes posições, não deixa de enfraquecer o potencial de mobilização necessário. As diferenças táticas e de percepção quanto a conjuntura colocada não são poucas, o que nos deixa em uma situação problemática.

Se por um lado temos a UJS, a Articulação Unidade na Luta e companhia, com uma posição extremamente acrítica e adesista frente a reforma, por outro, temos o divisionismo e o sectarismo do PSTU e do PSOL. Que adotam uma tática de oposição aberta ao Governo Lula como um todo e que através desta política meramente adjetivista (na medida que não fazem um contraponto por inteiro da Reforma Universitária) buscam apenas a sua auto-construção.

Para piorar este cenário, a esquerda do PT não tem conseguido avançar efetivamente para uma posição e uma atuação unificada. Muito pouco se tem conseguido avançar no diálogo e na atuação política conjunta entre as forças. Tanto do ponto de vista da disputa dentro do movimento, quanto politicamente acerca da tática a ser adotada. Temos observado algumas forças da esquerda petista acabarem por se deixar dirigir pelo sectarismo do PSOL e PSTU, ampliando ainda mais o distanciamento interno da esquerda do PT no movimento estudantil.

Alternativas a serem buscadas

É importante que recuperemos um bom nível de unidade na esquerda do PT dentro do movimento estudantil a curto prazo. Assim poderemos ter condições de fortalecer a luta e as mobilizações necessárias. O PSOL e o PSTU representam posições significativamente distantes das nossas. Evidente que não deveremos encará-los como sendo o que de pior há no movimento, o que seria uma grave injustiça, no entanto, temos de ter claro que as nossas diferenças não são meramente pontuais e que os nossos caminhos não se cruzam neste momento histórico. A dicotomia colocada esta entre querer barrar a reforma para disputar os rumos do governo e entre quem quer barrar a reforma para derrotar o governo.

Não devemos perder de vista que a Reforma Universitária não é uma disputa isolada dos movimentos sociais frente ao governo. Mas sim que há uma disputa maior a ser travada, como muito bem colocou Emir Sader, “a luta da esquerda hoje – dentro e fora do PT – é contra a hegemonia liberal dentro do governo. Caso esta prevaleça, a esquerda como um todo terá sido derrotada. Os caminhos desta luta podem ser distintos conforme a inserção de cada um, de cada movimento social, conforme a localidade e o setor social onde se situem. Mesmo os que considerem que se trata de uma batalha perdida, a luta contra a hegemonia liberal é um processo inevitável de acumulação de forças, porque o liberalismo penetra profundamente em quase todos os poros da sociedade e da prática política e cultural brasileiras. Sem um combate frontal a essa influência, não teremos no Brasil uma esquerda à altura das necessidades da construção de um modelo pós-neoliberal.”

Tendo isto em vista, nós da Kizomba devemos estar concentrando todos os nossos esforços para impulsionar este combate. Nisto passa a necessidade de estarmos aprimorando e atualizando a nossa organização.

A organização da Kizomba

Teremos no próximo período, além da Reforma Universitária, outros importantes desafios a serem protagonizados por nós, como é o caso do FSM, do Encontro Nacional de Mulheres da UNE, diversas eleições de DCEs e DAs, Congressos da UNE, UBES e UEEs e etc. Isto nos exigirá uma forte capacidade organizativa e de mobilização.

A nossa capacidade e necessidade de mobilização se traduz em um fortalecimento de nossa inserção social. “A correlação de forças sociais atual é desfavorável para a classe trabalhadora, pelo longo período histórico de refluxo do movimento de massas. Isto não quer dizer que não existe um movimento crescente e massivo, que construa organicamente uma unidade popular em torno de um projeto unificado de mudanças. É preciso estimular as lutas sociais e a construção de um amplo movimento de massas, unitário, que consiga se contrapor a hegemonia do capital financeiro” (J. Pedro Stédile). O nosso trabalho de base nunca foi tão imprescindível.

Devemos adotar uma política de maior fortalecimento e publicização da Kizomba. Isto só se dará por obra de nosso esforço coletivo, de nossa capacidade de estarmos envolvendo na dinâmica cotidiana do movimento, um conjunto ainda maior de lutadoras e lutadores. Ampliando as nossas relações com outros setores do movimento estudantil que não estão organizados. Por isso, devemos impulsionar a nossa atuação, enquanto Kizomba, nos mais diversos movimentos e frentes de atuação. O aprofundamento de nossa relações conjuntas com outros movimentos sociais, via CMS, deve ser reafirmado.

Nisso deveremos adotar uma política ainda mais ousada. Para isso é indispensável termos uma forte capacidade de intervenção organizada, nos possibilitando alcançar resultados mais substantivos. Torna-se fundamental o fortalecimento da Coordenação Nacional da Kizomba, enquanto espaço que possibilita a maior unificação, objetiva e subjetiva, de nossas ações. Muitas vezes cometemos o erro de nos deter por demasiado nas tarefas imediatas. Não sobrando espaço para tratarmos com profundidade das questões de estruturação organizativa e das tarefas para médio e longo prazo. Desta forma se acumulam as questões que permanecem pendentes, e ficamos mais distantes das soluções necessárias para darmos o salto qualitativo requerido.

Devemos rapidamente sanarmos nossos problemas organizativos que há muito tempo tem nos prejudicado. O mais grave deles talvez seja a falta de uma política de comunicação, tanto interna quanto externa, mais eficiente. Que de conta de nossas necessidades de maneira ágil e democrática. Outra questão que igualmente requer que nos debrucemos com maior atenção é quanto a ausência de uma política de finanças. A importância de estarmos atentos a isto é evidente, pois muitas vezes por deficiências materiais acabamos por despotencializar a nossa intervenção social. Devemos deliberar um política financeira que resolva esta questão. Parte da solução passa por termos uma pessoa encarregada de maneira específica para esta tarefa na CN-Kizomba.

Também devemos de maneira ágil dar conta de organizarmos um amplo mapeamento de nossa inserção nacional. Sem termos uma profunda clareza de quem somos, aonde estamos e quantos somos, fica extremamente difícil organizar a nossa intervenção. É importante darmos conta deste mapeamento em um curto prazo. Para que possamos organizar melhor a nossa atuação no próximo ano.

A Kizomba enquanto alternativa

Outra questão, que deve ocupar um espaço privilegiado em nossa agenda política, é quanto a nossa permanente ‘reinvenção’. Quando nos propomos a por em prática uma nova cultura política no interior do movimento estudantil, este desafio vem acompanhado de uma permanente atualização de nossas práticas e percepções.

O que as vezes acaba por ser esquecido ou posto em segundo plano. Manter este debate vivo e na “pauta do dia” em todos os nossos espaços de discussão é uma necessidade que deve ser coletivamente fomentada por nós. Nos colocando permanentemente sintonizados com a vitalidade que se demonstra nos corredores das universidades, nas ruas e em todos os espaços. A nossa ‘reinvenção’ constante passa por isso. Passa por fortalecermos o nosso trabalho de base, por ampliarmos a nossa capacidade de diálogo com os mais diferentes segmentos. Ampliarmos o processo de participação, de debate e elaboração coletiva é um elemento fundamental para nossa construção.

A Kizomba permanece, assim, sendo uma alternativa viva no movimento estudantil e para que possamos ir além, que devemos estar assumindo o desafio de afirmarmos e colocar em prática esta alternativa.

Uma ruptura necessária

A crise generalizada do Estado desenvolvimentista brasileiro, a partir do final dos anos 70, deu força a visão neoliberal. Que serviu para unificar a maior parte da burguesia brasileira, tendo os banqueiros à frente, e intensificou o ataque a todas as conquistas políticas, sociais e à anterior construção de um projeto de Estado desenvolvimentista brasileiro.

O conjunto do movimento popular e democrático lutou e reagiu com força e com crescente mobilização política, que se materializou na quase conquista da Presidência em 1989. Não bastasse a derrota eleitoral, o movimento sofreu duras e sucessivas derrotas sociais. A década de 90 foi o período de “terra arrasada”, iniciando-se com Collor e consolidando-se com FHC.

Os resultados do neoliberalismo no Brasil foram uma forte e dura recessão econômica, desemprego quase que estrutural, financeirização da economia e um implacável processo de mercantilização da vida em suas mais diferentes formas. Alguns, mais pessimistas, entendem que este processo é irreversível e que um viés desenvolvimentista de nação está completamente superado. No ano de 2002, a maioria absoluta da população brasileira buscou demonstrar a falência desta visão e a urgência de se retomar um projeto de país e uma mudança no modelo em curso no Brasil.

No entanto, passado quase a metade do Governo Lula, os sinais e os elementos colocados não apontam para as mudanças expressas pela maioria nas urnas. O atual cenário social calamitoso; onde temos um aumento da exclusão social, no desemprego e um PIB negativo demonstram um sentido exatamente contrário ao da mudança. Este cenário demonstra na verdade uma política deliberada de manutenção do receituário neoliberal. Os resultados negativos resultantes desta política conservadora são mais do que suficientes para demonstrar a urgência do Governo Lula mudar a sua política econômica atual.

Adotar uma política que estanque os danos da perversa herança neoliberal de quase uma década de governo do PSDB e aliados a frente do governo federal, e que avance para uma política de inclusão social, crescimento econômico e distribuição de renda é mais do que necessário. Só assim poderemos ver a alteração deste modelo, que tem produzido uma enorme concentração e transferência de recursos para o sistema financeiro internacional. Mais do que isso, que possamos avançar para um outro modelo, centrado no combate as desigualdades de classe, raça e gênero.

Esse enfrentamento das desigualdades deverá ser o motor do crescimento. Mudança é a palavra chave e para que esta mudança ocorra, é necessário que se opere um rompimento com a ortodoxia neoliberal que tem comandado a política econômica do país. Não é nada menos que isso que a maioria da população aguarda ansiosamente.

domingo

Após as prévias, é hora da unidade no PT de Porto Alegre

Maria do Rosário saiu-se vitoriosa, com todos os méritos, das prévias que escolheram a candidatura do partido para a Prefeitura da capital. Tendo o nosso reconhecimento como legitima vencedora.
Todos sabemos que processos internos como estes sempre geram traumas e fissuras internas, que se não forem bem trabalhadas podem gerar distanciamentos internos ainda maiores. Que é justamente o oposto que a conjuntura eleitoral exige do PT para disputar com chances de vitória.
Tem me causado surpresa, no entanto, as inúmeras manifestações de militantes e dirigentes partidários, apoiadores da Rosário, com tom provocativo e divisionistas nos últimos dias ao repercutir o resultado.
Apontam adjetivações contra os apoiadores do Rossetto (inclusive reproduzindo discursos da RBS) como o da vitória da "base" sobre os "caciques" e etc, para logo em seguida, reafirmar a necessidade de unidade. Adotando-se a tática do "bater com uma mão e afagar com a outra".
Prova disso é o boletim eletrônico do vereador Adelli Sell desta semana, onde após alfinetar com diversos argumentos provocativos, chama a tal falada "unidade", que chega a parecer, pelo tom das provocações anteriores, como um mero exercício de retórica.
Infelizmente, não é este um caso isolado, e nos causa tremenda preocupação. Afinal, como pode um determinado setor do partido querer, a partir de uma vitória por uma diferença de 56 votos, afirmar que não necessita da presença ativa da outra metade do partido para garantir a vitória do PT e do campo democrático e popular nas eleições? Ou será que a verdadeira motivação de alguns setores em apoiar a candidatura vitoriosa se dava apenas pela negação da candidatura oponente, em uma postura de puro sectarismo? Ou ainda será que a real motivação era impedir que se mantive-se o símbolo de Porto Alegre ser um local onde o PT conseguiu construir uma história virtuosa, distante do "ultra-pragmatismo" que assola o partido em outros locais (o exemplo mais gritante é São Paulo) e com isso retirar da esquerda este importante símbolo? Será por isso tal virulência em permanecer com uma postura de combate interno?
Espero que não. Espero que estas sejam posturas isoladas que não reflitam a política de todos os setores que apoiaram a candidatura da Rosário. Ela acredito que certamente não concorda com isso.
Acredito que, com responsabilidade e espírito coletivo condizentes com a história do Partido dos Trabalhadores nessa cidade, teremos plenas condições de superar tais problemas e construiremos a necessária unidade interna. Que não pode se tornar uma mera expressão vazia, mas uma real e solida construção política para sairmos vitoriosos novamente.

Juventude e trabalho

Muitos setores da juventude, quando atingem um determinado estágio de seu desenvolvimento, buscam encontrar formas que lhe permitam se emancipar de sua condição de total dependência dos pais.

Dentro de toda esta busca, há um grande leque de possibilidades, de formas que venham a florescer esta procura, não necessariamente tendo a vir a acontecer como uma regra pré-estabelecida para todos os jovens. Uma das maneiras mais freqüentes que costuma ser buscada para atingir a almejada independência é a procura de um emprego. Buscando-se um desatrelamento financeiro e uma maior autonomia no ir e vir.

Para uma parte significativa da juventude (podendo ser considerado por muitos inclusive como sendo a maior parcela), o trabalho é a única possibilidade de garantir a sua própria sobrevivência e a de seus familiares. A busca pelo emprego coloca-se como uma necessidade imprescindível, não lhe restando nenhuma outra alternativa. Devido a uma série de fatores sociais, os jovens se vêem em uma situação de obrigatoriedade em se iniciar no trabalho, onde, muitas vezes, isto ocorre de forma extremamente prematura, antecipando-se todo um processo de desenvolvimento e auto-aprendizagem. São inúmeros os casos de exploração de mão-de-obra infantil, jovens que são brutalmente retirados de sua infância e que passam a ter que desenvolver trabalhos em troca de quantias muito abaixo do salário dos demais trabalhadores que exercem as mesmas funções. Conformando-se uma condição de semi-escravidão.

Ao iniciar a busca, todo o jovem parte com a idéia de que não deverá enfrentar grandes dificuldades em conseguir uma oportunidade de emprego. Acreditando que, apesar do quadro que está instalado no mercado de trabalho, as suas potencialidades serão reconhecidas. No entanto, deparam-se com uma situação de total exclusão e de falta de oportunidades. Um ambiente nada favorável para se alcançar o acesso ao emprego.

Com o neoliberalismo, o desemprego atingiu proporções que muitos não acreditavam que fosse se atingir. Os índices de desemprego no Brasil, entre a população jovem, assumem contornos de total caos social. o jovem é barrado por sua “falta de experiência” ou ainda a sua “imaturidade”, não tendo por parte do patronato uma mínima preocupação social em relação ao quadro grave que está posto. Muitos, talvez a maioria, não conseguem encontrar uma oportunidade de emprego que minimamente se encaixe com que era almejado ou condizente com a sua qualificação profissional.

Acabam por se sujeitar a serem usados como mão-de-obra barata, tendo os seus direitos mínimos negados sendo privados de darem continuidade aos seus estudos e ao seu lazer. Sendo desde cedo, condicionado a se sujeitar a um regramento perverso, que não lhe permite nem ao menos questionar, sob o risco de perder o emprego que tanta dificuldade teve em conseguir. Vê-se toda uma parcela significativa de jovens em sua situação de total desesperança e desilusão sobre o sistema, sobre o país e até sobre si mesmo, não creditando em suas próprias potencialidades.

Fica um questionamento sobre de que forma se pode solucionar este problema posto sobre a sociedade. Não há solução para este problema que não passe por uma total mudança do sistema político, econômico e social em vigência. Outras medidas não passarão de atenuadoras e que, em um período muito curto, já tem a sua eficácia questionada. O que o jovem poderia fazer frente a todo este problema?

Em primeiro lugar, jamais pode aceitar esta condição sem se questionar e indagar de onde e originam o seus problemas socio-econômicos e, frente a isso, procurar encontrar caminhos que lhe possibilitem enfrentar, e até mesmo superar esta condição que atualmente temos colocada. E ter claro que a sua emancipação e independência não serão atingidas se resumirem-se apenas a conquista de um emprego. A sua emancipação passa por uma conquista por inteiro. Deve ser conquistada sem se acomodar, não acreditando que virá de maneira fácil e tranqüila, sem lutar e ousar.